Frei Betto – um efêmero florescer que resiste

Por Cinthia Martins (R.A: 820266521) e Gabriella Bernardino (R.A: 818111264).


Aos 76 anos o dominicano mais combativo da nossa história permanece ativo na luta contra a fome e as desigualdades.
Discípulo de São Tomás de Aquino, filósofo e teólogo medieval e um dos principais Mestres da Igreja Católica, Frei Betto é desses homens que vislumbram e perseguem um ideal no horizonte utópico.
O escritor e assessor da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) é referência em toda a América Latina quando o assunto é a erradicação da fome através de um projeto pedagógico e emancipatório que possibilita que os indivíduos se tornem protagonistas de suas histórias.

“Quando estamos comprometidos com os mais pobres a gente é ousado, é revolucionário e
combativo, porque só temos a ganhar que é conquistar direitos.”
Carlos Alberto Libânio Christo, nascido em Belo Horizonte em 25 de agosto de 1944, é um dos mais conhecidos propagadores das comunidades eclesiais de base (CEBS) movimento cujo o centro é a leitura bíblica articulada com a vida, a realidade política e social em que se encontram os despossuídos, miseráveis e explorados que permeiam as classes mais populares, através do método ver-julgar-agir as CEBS auxiliam seus educandos a perceber
a realidade em que vivem confrontando a realidade observada junto aos valores do evangelho e direitos humanos.
Aos 76 anos o Frei se mantém ativo auxiliando nos trabalhos de base junto a movimentos populares.
“Uma pessoa comum tem uma percepção da vida como fenômeno meramente biológico, o militante tem a percepção da vida como fenômeno biográfico, ele sabe que tem um desafio histórico pela frente.”
Autor de 68 livros, o intelectual foi premiado duas vezes com o Prêmio Jabuti em 1982 com Batismo de Sangue e em 2005 com Típicos Tipos- Perfis literários .
Frei Betto carrega consigo a essência dos revolucionários que não se curvam aos dissabores de regimes ditatoriais. “Pra quem ficou quatro anos preso, essa quarentena não é nada.”
O Frade Dominicano se refere à sua segunda prisão que perdurou de 1969 à 1973. A época o Frei figurou entre os ativistas mais procurados pela ditadura tendo o seu nome e rosto divulgados pela mídia sob a alcunha de “padre terrorista”.
Nas últimas décadas a difusão das igrejas neopentecostais no Brasil vem desempenhando papel fundamental num programa de controle social no qual a teologia se aplica como meio de doutrinação para manter seus fiéis sob domínio. Ele explica que a religião neste caso é utilizada como um grande negócio.
” Eles exploram o povo para enriquecer, é um processo violento dentro das igrejas neopentecostais conservadoras de extorsão do pouco dinheiro que o povo tem e com isso exercem grande poder de controle sobre uma grande quantidade de pessoas muito pobres que não tem recursos e que vão a igreja a espera de curar as enfermidades que sofrem desse modo conseguem ter influência no poder na medida em que se elegem, vereadores, deputados, senadores e etc.”
Frei Betto publicou este ano o livro, Diabo na Corte: leitura crítica do Brasil pela editora Cortez. A obra pretende desvendar a campanha de desinformação do presidente, Jair Messias Bolsonaro.
Crítico ferrenho do atual governo, o Frade que tem como traço forte de sua personalidade a franqueza entrelaçada a uma serenidade inabalável dispara “No Brasil há um genocídio em curso, não há como conviver com este governo genocida que desmonta todas as políticas de proteção a vida o genocídio dos mais pobres no Brasil é intencional.” De acordo com o Frei o momento conturbado poderia ter sido evitado a medida em que os
poderes reconhecessem o risco a democracia personificado na figura do atual presidente.
“ O antipetismo criou uma força tão vigorosa que os poderes fizeram vistas grossas engoliram a seco os 30 mil que ele queria matar na ditadura e deixou o barco correr, a elite política, a elite financeira e a elite dos meios de comunicação no Brasil queriam descartar as forças progressistas então passaram a naturalizar os horrores do Bolsonaro e deu no que
deu.”
E não poupa críticas à ala progressista ” Nós progressistas também temos culpa no cartório porque abandonamos o trabalho de base.”
Frei Betto mantém a fé na superação do momento caótico que perpassa o país. No entanto, alerta que ainda há um longo caminho a percorrer. Para o Frei, a utopia é um horizonte no qual “o indivíduo se percebe no mundo como parte integrante de um povo, de uma nação, de um continente e sobretudo de um momento histórico”.
Atualmente o Frei divide seu tempo entre escrita, palestras e conferências. Em todas as atividades, o intuito é semear no povo consciência crítica e histórica. “É preciso formar uma consciência crítica porque é a única maneira da gente ter primeiro uma desconfiança e depois investigar pra saber qual é a versão real.”, explica.
“Fechar o horizonte utópico é um processo que o capitalismo nos impõe fazendo com que as novas gerações ao invés de buscar um novo projeto histórico civilizatório o troquem por ambições de uma vida boa, fama, poder, riqueza e beleza tudo centrado no individualismo
que foi a forma que o sistema encontrou de impedir que a juventude assuma seu protagonismo na história.”
O escritor acredita no potencial transformador da juventude. Segundo ele, nada pode apagar da juventude seu traço mais marcante: a rebeldia. “A juventude é potencialmente revolucionária.”, ele diz.
Ao ser perguntado se é possível educar o povo em tempos de pós verdade, Frei Betto nos inunda com sua fé: “a história não para não podemos perder a esperança.”
Muito mais que um utopista Frei Betto é um semeador de possibilidades num vasto horizonte e a efêmera condição humana não é capaz de dissipar o florescer de uma espiritualidade baseada na solidariedade e no combate às desigualdades.