És Anarquista?
– Sim, porque sou trabalhador consciente.
– Que é ser trabalhador?
– É viver pelo esforço do seu trabalho.
– Quando se pode dizer que o trabalhador é consciente?
– Quando conhece as causas da sua miséria e as combate.
– Que é trabalho?
– É o esforço para produzir.
– Que é produzir?
– É criar riqueza.
– Que é riqueza?
– É tudo o que pode ser útil ao homem.
– Então o sol é uma riqueza?
– Sim, como o ar, a água, etc.
– Mas o sol não é produzido pelo homem.
– Não, por isso se chama riqueza gratuita.
– Há outras riquezas gratuitas?
– Há, o ar, a chuva, os rios, os mares, etc.
– A terra é uma riqueza gratuita?
– Deveria sê-lo, porque é a matéria natural da produção natural da produção das riquezas minerais e orgânicas; mas não o é.
– Porque não o é?
– Porque é possuída por alguns homens em prejuízo da maioria dos homens.
– Isso é justo?
– Não. Isso é a causa da maior parte das desgraças humanas. Que dirias de um indivíduo que pudesse apropriar-se da luz e do calor solar e o fizesse para vendê-los depois aos outros homens?
– Que seria um infame!
– Que dirias dos homens que se apropriam de toda a Terra e não permitam que os outros a cultivem?
– Que são infames.
– Que dizes de uma sociedade que mantém esse regime?
– Que é uma sociedade prejudicial ao homem e portanto precisa ser reformada pela extinção do direito de propriedade privada.
– Quem mantém a propriedade privada?
– O governo, isto é, alguns homens que pretendem dirigir os outros homens.
– Qual é o meio de que lançam mão para tal fim?
– A lei, e para garantir a lei o soldado.
– Que é lei?
– O conjunto de regras impostas pelos reis, conquistadores, capitalistas, etc… às classes trabalhadoras com o fim exclusivo de manter a propriedade privada, isto é, a posse das riquezas, e regular a sua transmissão.
– Que é o soldado?
– É um trabalhador inconsciente que se sujeita aos possuidores da terra para manter essa posse a troco de um miserável pagamento.
– Como se sujeita ele?
– Sujeita-se pela disciplina.
– Que é a disciplina?
– É a escravização da vontade do soldado ao seu superior. O soldado obedece ao que lhe mandem sem saber como nem porquê.
– Qual é o ofício do soldado?
– Matar.
– Mas a lei não proíbe matar?
– Proíbe, mas se o soldado matar um trabalhador que protesta contra o governo, a lei declara que o soldado é um virtuoso.
– O papel do soldado é digno?
– Não. É o mais vil possível.
– E como há trabalhadores que se fazem soldados?
– São iludidos pelos governantes e arrastados pela miséria.
– Como conseguem iludi-los?
– Com fardamentos vistosos e insuflados neles o “amor” à pátria. Patriotismo é um sentimento mesquinho que leva o indivíduo a supor que os que nasceram no seu território são superiores aos outros homens.
– Esse sentimento leva a más conseqüências?
– É o elemento principal que arrasta as massas humanas à “Guerra”.
– Que é a guerra?
– É um processo de dominação pela morte.
– Como se explica?
– A história universal mostra que os “grandes” de uma nação armavam soldados, adestravam-nos e subjugavam pela força aos homens de outras terras, ou para escravizá-los, ou para se apossarem da lavoura, suas minas, de suas riquezas até mesmo de suas mulheres. Os diretores dessas guerras, um Cambyses, um Alexandre Magno, um César, um Napoleão. Eram simples bandidos que procuravam justificar as suas invasões com pretextos fúteis de “honra, vingança, amor à Pátria”. Hoje as guerras são a mesma coisa, luta por causa de colônias, de comércio, de capitais comprometidos.
– Quem faz a guerra?
– São os capitalistas, por intermédio dos diplomatas e pelos canhões movidos por soldados.
– Que fazem os soldados da polícia?
– Mantém a chamada ordem ou “hierarquia”, isto é, o regime de autoridade pelo qual os inferiores se subordinam aos superiores. Desde que alguns trabalhadores procuram levantar-se contra os seus exploradores a polícia intervém para “manter a ordem” isto é obrigar os trabalhadores a se submeteram à exploração.
– Como reformar isso?
– Extinguindo a propriedade privada e tornando-a posse da Terra coletiva.
– Quem fará essa reforma?
– Os dirigentes capitalistas não o farão porque isso seria contrário aos seus interesses; logo essa reforma só pode ser feita pelos trabalhadores.
– Como se chamará o regime da propriedade coletiva?
– Chamar-se-á Anarquia.
– Que significa esse nome?
– Significa “não comando”, isto é, exclusão dos superiores e portanto “igualdade, não autoridade”.
– A anarquia exige ordem?
– É o único meio de obter a verdadeira ordem, que hoje é mantida apenas pela opressão. Basta que por um dia se suprimam a polícia e o exército para que a “desordem” atual se manifeste em desmando de toda a espécie.
Errico Malatesta – Anarquista Italiano
Por: Guilherme Ulema