Guerra Civil Espanhola
A chamada Guerra Civil Espanhola foi um conflito bélico deflagrado após um fracassado golpe de estado de um setor do exército contra o governo legal e democrático da Segunda República Espanhola. A guerra civil teve início após um pronunciamento dos militares rebeldes, entre 17 e 18 de julho de 1936, e terminou em 1° de abril de 1939, com a vitória dos militares e a instauração de um regime ditatorial de caráter fascista, liderado pelo general Francisco Franco.
Precedentes
A derrubada temporária dos Bourbons absolutistas por Napoleão Bonaparte, em março de 1808, a Guerra de Independência contra a ocupação francesa, a abertura das Cortes de Cádis, em 1810, e a proclamação da Constituição liberal de 1812 assinalam o desaparecimento do Antigo Regime espanhol, que, durante o reinado de Carlos III, chegou a ser considerado como um exemplo de Despotismo Esclarecido. Durante todo o século XIX e o início do século XX, no entanto, a Espanha não conseguiu completar, política e socialmente, a sua revolução burguesa de forma a produzir uma institucionalidade liberal-democrática estável.
O século XIX espanhol foi um período especialmente conflituoso, com lutas entre liberais e absolutistas, entre membros rivais da Casa de Bourbon (isabelinos e carlistas), e mais tarde entre monarquistas e republicanos, sobre o pano de fundo da perda das colônias americanas e filipinas.
A economia espanhola teve um crescimento rápido, desde o final do século XIX até ao início do século XX. Em especial, as indústrias mineiras e metalúrgicas lucraram e expandiram-se enormemente durante a Primeira Guerra Mundial, fornecendo insumos a ambos os lados em disputa.
Entretanto, os resultados desse crescimento não se refletiram em mudanças nas condições sociais. A agricultura, sobretudo na Andaluzia, continuou em mãos de latifundiários, que deixavam grandes extensões de terra sem cultivar. Somava-se a isto a forte presença da Igreja Católica, que se opunha às reformas sociais e se alinhava aos interesses da elite agrária. Finalmente, a monarquia espanhola apoiava-se no poder militar para manter o regime. O fim da monarquia e o advento da república, em 1931, em nada mudou esta configuração política básica, com a agravante de que Igreja e Exército se mantiveram monárquicos e as tentativas de golpe tornaram-se constantes.
Com o crescimento da economia, cresceu também o movimento operário. Após a fundação da primeira sociedade operária em Barcelona (1840), o movimento cresceu e se espalhou pelo país. Desde o início, e principalmente na Catalunha, a principal região industrial de Espanha, o anarquismo tornou-se a tendência política mais difundida entre os trabalhadores. A principal confederação sindical, a CNT (Confederación Nacional del Trabajo), sob influência anarcossindicalista, recusava-se a participar na política partidária.
O choque entre classes é frequente e violento. Desde o fim do século XIX até o início do século XX, grupos de extermínio, como o Sindicato Libre, procuram suprimir os sindicatos através do assassinato dos seus principais militantes. Do outro lado, grupos de militantes sindicalistas, como o famoso Nosotros, também assassina religiosos e industriais suspeitos de apoiar o Sindicato Libre. Insurreições armadas, tanto de direita como de esquerda, ocorrem com regularidade.
O fim da monarquia, a eleição da Frente Popular e o golpe
Com a renúncia do ditador Primo de Rivera após uma onda de escândalos de corrupção, o rei Afonso XIII procurou restaurar o regime parlamentar e constitucional. Foram convocadas eleições municipais em Abril de 1931 e, embora os monarquistas tivessem sido vitoriosos, os republicanos conquistaram a maioria nas grandes cidades. Prevendo uma guerra civil, o rei Afonso XIII prefere abdicar e é proclamada a Segunda República.
Novas eleições são convocadas para compor uma assembléia constituinte em Junho, que institui a separação entre Igreja e Estado. Por este motivo, Alcalá Zamora, chefe do governo provisório, abdica.
Novas eleições acontecem em Dezembro de 1931, nas quais a esquerda sai vitoriosa. Alcalá Zamora é eleito presidente da República e encarrega Manuel Azaña de organizar o governo. O governo da República não consegue avançar na resolução da questão das autonomias regionais, nem no encaminhamento das questões agrária e trabalhista. Na questão religiosa, o governo Azaña cedeu moderadamente ao espírito anticlerical que predominava no parlamento, através da dissolução da Companhia de Jesus na Espanha, ficando preservadas as demais ordens religiosas, que no entanto foram proibidas de dedicar-se ao ensino. Comprimido, por um lado, pela direita e a Igreja – que viam a laicização do Estado e da educação de maneira muito negativa – e, por outro, a esquerda e os anarquistas – os quais consideravam as mesmas reformas insignificantes – o governo Azaña é incapaz de agradar à população.
Como economia predominantemente agrário exportadora, a Espanha havia sido pouco atingida pela crise de 1929: o desemprego era pequeno e o salário médio por dia trabalhado havia aumentado significativamente nos primeiros anos da Segunda República. Este aquecimento da economia aguçava as tensões sociais já existentes e, com elas, a aguda divisão político-ideológica da sociedade, que já vinha do século anterior.
Em maio de 1931, os anarquistas incendiaram a Igreja dos Jesuítas na Calle de la Flor, no centro de Madrid. Em agosto de 1932, o general monarquista Sanjurjo tenta dar um golpe, mas fracassa. Condenado à morte, é depois indultado e continua a conspirar na prisão.
Em 1933, a recusa dos anarquistas em dar apoio aos partidos de esquerda e a sua propaganda pela “greve do voto” permitem a vitória eleitoral da direita, representada pela Confederação Espanhola das Direitas Autônomas (CEDA) de José Maria Gil Robles. Segue-se uma insurreição da esquerda, que foi mal sucedida em toda a Espanha – menos nas Astúrias, onde os operários dominaram Gijón por 13 dias. Este evento ficou conhecido como Comuna das Astúrias.
Com milhares de militantes feitos prisioneiros, os anarquistas decidem apoiar a esquerda nas eleições de 1936. Espera-se que o novo governo lhes conceda anistia. A esquerda vence em 16 de Fevereiro, com 4 645 116 votos, contra 4 503 524 da direita e 500 mil votos do centro, mas as particularidades do sistema eleitoral – que favorecia as maiorias – dão à esquerda a maioria das cadeiras no parlamento.
Em maio de 1936, Alcalá Zamora é destituído e Azaña assume a Presidência da República, tendo como seu primeiro-ministro o socialista Largo Caballero. A direita então lança-se a preparar um golpe militar que se concretiza em 18 de Julho.
O desenrolar das operações: do golpe à vitória franquista
Se os militares golpistas esperavam resolver a questão com um pronunciamento rápido e sem muito derramamento de sangue, à maneira do século XIX, foram surpreendidos pelo nível de mobilização ideológica da sociedade espanhola da época: de modo geral, exceto em casos isolados, os militares triunfaram nas regiões onde a direita havia sido mais votada em fevereiro de 1936, enquanto a esquerda – principalmente pela ação das milícias armadas socialistas, comunistas e anarquistas – vence nas regiões onde havia sido mais votada a Frente Popular: em Madrid e Barcelona, a insurreição foi esmagada quase que imediatamente.
Em 21 de julho, os golpistas controlavam o Marrocos Espanhol, as Canárias (exceto a ilha de La Palma), as Baleares (exceto Minorca) e o oeste da Espanha continental. As Astúrias, a Cantábria, o País Basco e a Catalunha, assim como a região de Madrid e Murcia, estavam nas mãos dos republicanos. Mas os golpistas conseguem apoderar-se das cidades mais importantes da Andaluzia: Sevilha – tomada pelo General Queipo de Llano, que se tornaria tristemente célebre pelas suas atrocidades – Cádis, Granada e Córdoba.
As posições golpistas no Sul da Espanha estando separadas de suas posições mais ao Norte, realiza-se a Campanha da Estremadura, quando o bombardeio de aviões alemães e italianos contra a marinha republicana no Estreito de Gibraltar, o que permite a passagem de tropas golpistas do Marrocos para a Espanha.
Um avanço rápido de Sevilha a Toledo, realizado sob o comando do Tenente-Coronel Yagüe, que aplicava as técnicas alemãs de Blitzkrieg, com avanços rápidos de tropas de infantaria apoiadas por artilharia e aviação (acompanhada pela eliminação sistemática de pessoas suspeitas na retaguarda) , possibilitou aos golpistas nacionalistas tomarem Badajoz, em agosto de 1936, o que lhes permite organizar um frente coerente contra o campo republicano – estratégia esta, mais rotineira, adotada por Franco, que preferiu apoiar-se primeiro sobre a fronteira do Portugal de Salazar a tentar um avanço direto até Madrid, a partir do Sul.
A morosidade dos golpistas e a ação das milícias populares na defesa republicana fizeram com que o conflito assumisse, assim, um caráter ideológico e potencialmente revolucionário.
Uma vez tendo feito junção as forças golpistas em Badajoz, inicia-se o avanço sobre Madrid, buscando-se encerrar a campanha o mais rápido possível. Em 28 de setembro, as forças golpistas rompem o cerco republicano ao Alcazar de Toledo, defendido por José Moscardó desde 22 de julho – uma conquista sem muito significado estratégico mas que foi logo revestida de características lendárias (o filho de Moscardó teria sido fuzilado após haver pedido ao pai, ao telefone, que se rendesse) e serviu de mito fundador do regime franquista.
Em 8 de novembro começa a Batalha de Madrid, mas o lento movimento das forças golpistas, que haviam levado três meses deslocando-se a partir de Sevilha, permite ao governo republicano estabilizar a frente em 23 do mesmo mês. No Norte, os golpistas tomam Irún em 5 de setembro e San Sebastián no dia 13, isolando o Norte republicano.
Em inícios de 1937, os golpistas tentam novamente tomar Madri: uma ofensiva a partir de Jarama, de 6 a 24 de fevereiro, é apoiada pelo avanço de tropas de voluntários italianos fascistas na direção de Guadalajara, de 8 a 18 de março. A resistência das Brigadas Internacionais republicanas frustra os planos das forças italianas e, mais uma vez, converte o que se pretendia como golpe de estado numa guerra civil de longa duração, em que o acirramento das paixões políticas internas era potencializado pela presença de contingentes militares estrangeiros, ideologicamente opostos, numa verdadeira guerra civil européia, em que voluntários italianos fascistas e alemães nazistas, por exemplo, enfrentavam voluntários esquerdistas das mesmas nacionalidades.
A substituição do governo republicano de Largo Caballero pelo de Juan Negrín – que buscou apoiar-se, internamente, no Partido Comunista, e, externamente, na aliança com a União Soviética – deu conta do acirramento ideológico do conflito, mesmo no interior do campo republicano, levando aos incidentes de maio em Barcelona, de enfrentamento armado entre forças do governo e comunistas contra diversas milícias de Extrema Esquerda – anarquistas, trotskistas e semi-trotskistas -seguidos por uma cruel repressão policial à mesma Extrema Esquerda, sob o comando dos comunistas. Neste interím, o governo Negrín tenta substituir as milícias, tanto quanto possível, por um exército republicano regular, e lança, em agosto, na frente de Aragão, uma ofensiva em Belchite, tentando aliviar a pressão sobre a frente Norte.
A ofensiva fracassa; o lado republicano tinha menos armas modernas (blindados e aviões) do que o nacionalista, e, ao invés de combinar ações defensivas com a infiltração de guerrilheiros na retaguarda franquista (para o que teria que contar com as milícias anarquistas) preferia tentar vitórias convencionais com ganho propagandístico para os comunistas que comandavam as unidades de elite do exército regular. Estas ofensivas, que não tinham um alvo estratégico claro, soldaram-se sempre com enormes perdas de homens e equipamento, solapando ainda o moral das Brigadas Internacionais.
Acrescente-se a isso que as dissensões internas e insanáveis no campo republicano, sobre se convinha primeiro ganhar a guerra militarmente, ou se a guerra deveria ser combinada com uma revolução socialista, fizeram com que este governo jamais conseguisse a autoridade indisputada que precisaria para vencer militarmente, ao mesmo tempo que não possuía uma ideologia coerente que garantisse sua sustentação política: no verão de 1937, soma-se à ofensiva fracassada em Belchite o avanço dos golpistas no Norte, onde é rompido o assim chamado “Cinturão de Ferro” republicano: Bilbao, Santander e finalmente Gijón, em 20 de outubro, são ocupadas pelos franquistas e a Frente Norte desaparece, com os prisioneiros republicanos sendo internados no campo de Miranda de Ebro. A República perde, assim, o apoio do nacionalismo basco, assim como uma das suas bases industriais mais importantes. No Sul, depois da tomada de Málaga pelos franquistas em 8 de fevereiro, a frente havia estabilizado-se na província de Almería.
Em fins de 1937, os republicanos tomam a iniciativa e fazem uma ofensiva na direção de Teruel, que é tomada em 8 de janeiro de 1938, apenas para ser recuperada pelos franquistas em 20 de fevereiro. A contra-ofensiva franquista toma Vinaroz em 15 de abril, atingindo o Mar Mediterrâneo, e a zona republicana remanescente é dividida em duas partes, isolando a Catalunha.
Os republicanos contra-atacam em 24 de julho na Batalha do Ebro, e acabaram por retirar-se em 16 de novembro após uma longa batalha de atrito, que permite aos franquistas o caminho para a tomada da Catalunha. Em 23 de setembro o governo republicano ordena a retirada total das Brigadas Internacionais, numa tentativa (fracassada) de modificar a posição de não intervenção mantida pelos governo francês e inglês pela retirada de uma força militar sob forte influência comunista. Em 23 de dezembro inicia-se a batalha por Barcelona, que cai nas mãos dos franquistas em 26 de janeiro de 1939. As tropas golpistas ocupam a fronteira com a França e cortam a retirada dos republicanos.
Em março de 1939, começa uma pequena guerra civil dentro do campo republicano, quando o Coronel Casado, comandante do Exército do Centro, dá um golpe de estado em Madri, apoiado pelos oficiais de carreira (que acreditavam que “entre militares nos entenderemos melhor”), golpe este que tinha como objetivo a ruptura com os comunistas para facilitar negociações com os franquistas, enquanto o governo Negrín, partidário da continuação da resistência – e esperando que o estalar iminente da Segunda Guerra Mundial trouxesse novos apoios aos republicanos – refugia-se na chamada Posição Yuste.
Os franquistas, no entanto, exigem dos casadistas a rendição incondicional, e Madri cai em 26 de março. Com a queda de Valencia e Alicante em 30 de março, e de Murcia em 31, a guerra termina em 1o. de abril.
A questão religiosa na Guerra Civil
O liberalismo, na Espanha, tinha, desde os inícios do século XIX, sido violentamente anticlerical; entre os anarquistas, muito influentes na Esquerda, o anticlericalismo havia sido sempre particularmente agressivo, ao contrário dos socialistas marxistas. Na medida em que a Guerra Civil foi a conclusão dos enfrentamentos político-ideológicos do século XIX espanhol, a identificação da Igreja com a Direita determinou o anticlericalismo da Esquerda na sua generalidade: Já em 14 de outubro de 1931, no jornal El Sol, o então primeiro-ministro Azaña equiparara a proclamação da República com o fim da Espanha católica, e durante a Guerra Civil, como Presidente da República, teria dito num de seus discursos, que preferia ver todas as igrejas de Espanha incendiadas a ver uma só cabeça republicana ferida, e o radical catalão Alejandro Leroux teria conclamado a juventude a destruir igrejas, rasgar os véus das noviças e “elevá-las à condição de mães”.
A perseguição anticatólica durante a Guerra Civil apenas continuou um padrão já existente: nos só quatro meses que precederam a guerra civil já 160 igrejas teriam sido incendiadas. Durante a Guerra, pela repressão republicana, segundo o historiador Hugh Thomas, foram mortos 6861 religiosos católicos (12 bispos, 4.184 padres, 300 freiras, 2.363 monges); uma obra mais recente, de Anthony Beevor, dá números muito semelhantes (13 bispos, 4.184 padres seculares, 283 freiras, 2.365 monges). De acordo com o artigo espanhol, foram destruídas por volta de 20.000 igrejas, com perdas culturais incalculáveis pela destruição concomitante de retábulos, imagens e arquivos. Diante disto, é pouco surpreendente verificar que a Igreja Católica, tenha chegado, na sua generalidade a propagandear a revolta contra o governo e chegado a compará-la, numa declaração coletiva de todo o episcopado (1 de julho de 1937) com uma cruzada moderna; note-se, no entanto, que os mesmos bispos espanhóis, numa carta de 11 de julho do mesmo ano de 1937, mostraram-se ciosos em desmentir à opinião católica liberal, que via na intransigência conservadora do clero espanhol a razão das perseguições por ele sofridas, argumentando que a Constituição republicana de 1931 e todas as leis subsequentes haviam dirigido a história da Espanha num rumo contrário à sua identidade nacional, fundada no Catolicismo – ou, nas palavras do Cardeal Segura y Sáenz: “na Espanha ou se é católico ou não se é nada”.
Muito embora houvessem sido realizados esforços de propaganda pelos republicanos no exterior em favor da liberdade religiosa (o Ministro da Justiça do governo Negrín, Manuel Irujo, autorizou o culto católico, que, no entanto, na prática realizou-se de forma semi-clandestina) de forma a não alienar a opinião pública católica internacional e os próprios grupos católicos no campo republicano (muito notadamente o principal partido basco, o PNV) o campo republicano era em geral anticlerical e apoiava a repressão à Igreja. Por outro lado, o escritor e filósofo católico francês Jacques Maritain protestou violentamente contra as repressões franquistas contra o clero basco, e teria dito que “a Guerra Santa, mais do que ao infiel, odeia ardentemente os crentes que não a servem”.
Em 11 de maio de 2001, o papa João Paulo II procederia à beatificação de 233 vítimas religiosas da repressão republicana. Uma nova beatificação de outras 498 vítimas seria proclamada por Bento XVI em 28 de outubro de 2007. Esta última beatificação, que não foi celebrada pelo próprio papa, não sendo incluída, entre suas celebrações litúrgicas, foi no entanto, a maior beatificação da história da Igreja Católica. O papa declarou, na ocasião, a importância do martírio como testemunho de fé numa sociedade secularizada. Continuam sem solução os protestos dos parentes das vítimas das repressões nacionalistas ao clero basco contra o que consideram falta de reconhecimento da hierarquia católica.
Dois contingentes militares
De um lado lutavam a Frente Popular, composta pela esquerda (e extrema esquerda como o comunismo, anarquismo mas também o governo eleito liberal-democrático) e os nacionalistas da Galiza, do País Basco e da Catalunha, que defendiam a legitimidade do regime instalado recentemente no Estado, (a República proclamada em 1931 e os respectivos estatutos de autonomia).
Do outro lado os nacionalistas (compostos por monárquicos, falangistas, e militares de extrema direita, etc. O seu referente político (sobretudo para a Falange) era o general José Sanjurjo, chave da intentona militar de 1932, mas que morreu num acidente aéreo ao se transladar de Portugal para a zona ocupada pelos nacionalistas. Só durante o decorrer da guerra, os nacionalistas, chefiados pelo militar Francisco Franco irão aceitar progressivamente a sua indiscutível liderança.
O “Movimiento Nacional” de Franco
A sublevação fascista tentava impedir a qualquer preço que as instituições republicanas assentassem de maneira estável e permanente o regime democrático, impedindo o trabalho de um governo real de esquerda que estava para realizar profundas reformas econômicas, jurídicas e políticas no conjunto do Estado. Sob o suposto afã de lutar contra o perigo do aumento do comunismo e do anarquismo em certos lugares do Estado, ocultava-se realmente o levantamento contra o regime institucional e democrático estabelecido, na tentativa de impedir a continuação e assentamento da democracia e daquilo que os fascistas consideravam intoleráveis experiências de colectivismo.
Mas outra das claras intencionalidades do chamado “Movimiento Nacional”, além de lutar contra o “perigo vermelho”, foi lutar contra o que consideravam o “perigo separatista” tentando impedir a todo preço a instituição dos governos autônomos nas nações chamadas históricas.
Aliados à Igreja Católica, Exército e latifundiários, buscavam implementar um regime de tipo fascista na Espanha,o que consideravam mais condizente com a “originalidade espanhola (suas tradições políticas de raiz católica e autoritária).No entanto, o franquismo não foi fascista, se por tal entender-se um regime fundado numa base política de massa, na mobilização mais ou menos permanente dos seus partidários e no papel importante atribuído a certos grupos sociais emergentes: mesmo antes da queda dos regimes efetivamente fascistas, o regime acabou muito cedo por configurar-se como uma ditadura pessoal apoiada nos grupos dominantes tradicionais, muito semelhante nisto ao Portugal salazarista.
Os apoios internacionais
Aos Nacionalistas
As tropas do chamado “Movimiento Nacional” foram reforçadas, desde o início da guerra pela ajuda militar direta da Alemanha de Hitler, expressa no bombardeamento a Guernica e Madrid, e da Itália de Mussolini, que enviou um corpo de tropas voluntárias para a frente nacionalista, assim como engajou aviões e submarinos no esforço de guerra franquista. O Portugal de Salazar , embora ocultado sob a capa da neutralidade, autorizou o recrutamento de voluntários para combater pelos Nacionalistas, os Viriatos, permitiu o abastecimento das tropas rebeldes com armas e logística através de seu território além de recusar a entrada de refugiados ; a Irlanda tendo embora o seu governo declarado a participação na guerra como ilegal, cerca de 700 irlandeses combateram pelos Nacionalistas comandados pelo General Eoin O’Duffy, um veterano histórico do IRA que na Irlanda presidia os Camisas Azuis, algo entre uma associação de ex-militares e um partido fascista.
O Vaticano apoiou igualmente Franco, pois a Igreja condenava o comunismo – e também porque a política anticlerical do governo da República não lhe oferecia outra alternativa. O papa Pio XI, no entanto, que não tinha simpatias pelo fascismo, e que em 1937 publicaria a encíclica em alemão Mit brennender Sorge (“Com profunda preocupação”), condenando a ideologia nazista, não chegou jamais a oferecer um apoio incondicional ao campo franquista. No País Basco- que ficou isolado do restante da zona republicana desde o início da guerra – grande parte do clero católico colocou-se ao lado do nacionalismo basco e pela República, escapando assim à sorte dos seus análogos no restante do território republicano, onde as igrejas foram saqueadas e os padres perseguidos como agentes do fascismo. Pelo menos uma figura do alto clero espanhol, o cardeal-arcebispo de Tarragona Vidal y Barraquer – que havia sido exilado na Itália pela Generalitat republicana catalã – tentou realizar esforços por uma paz negociada, o que lhe valeu o desprazer constante do governo franquista, que impediu o seu retorno a Espanha até à sua morte em 1943, na Suíça. De certo modo, a divisão no interior do catolicismo mundial encontra-se bem descrita num artigo, muito posterior, do escritor e católico integrista brasileiro Gustavo Corção que relata como um grupo de padres bascos, buscando entrevistar-se com Pio XI para conseguirem um protesto seu contra as perseguições franquistas ao clero basco, teria sido impedido de conferenciar com o pontífice pelo seu Secretário de Estado, o cardeal Pacelli – que, mais tarde, como papa Pio XII, seria objeto de fortes controvérsias quanto a sua postura em relação ao fascismo. O mesmo Pio XII, tendo sido elevado ao papado durante o término da Guerra Civil, saudou o fim da guerra com a vitória nacionalista no documento Com imenso gozo e em discurso radiofônico de 18 de abril de 1939.
Aos Republicanos
As tropas republicanas receberam ajuda internacional, proveniente da URSS (alguns assistentes militares e material bélico) e das Brigadas Internacionais composta de militantes de frentes socialistas e comunistas de todo o mundo e de numerosas pessoas que a título individual entravam na Espanha a defender o governo da República. Vários intelectuais europeus e americanos participaram deste esforço, nomeadamente o romancista americano Ernest Hemingway, o escritor inglês George Orwell, o poeta também inglês W. H. Auden, os escritores franceses André Malraux e Saint-Exupéry e a matemática, católica e ativista política, também francesa, Simone Weil. Dos brasileiros que lutaram nas Brigadas – principalmente militares comunistas de prévia militância na Aliança Nacional Libertadora – celebrizar-se-ia, sobretudo, Apolônio de Carvalho, cuja atuação nas Brigadas seria seguida, após seu internamento na França, pela sua participação heroica na Resistência Francesa.
Os governos da Inglaterra e da França, optaram por ficar de fora, impondo um embargo geral à exportação de armas à Espanha. Oficialmente, este embargo foi furado pela Alemanha e pela Itália, e não levou a qualquer consequência, na ausência de sanções impostas pela Liga das Nações). A Inglaterra sediou o o Comite de Não Intervenção, só que este comite só funcionava para impedir que ajuda internacional chegasse a República espanhola através da fronteira francesa e da Baía de Biscaia. Os golpistas, liderados pelo fascista Franco, recebiam farto armamento e reforços pela fronteira portuguesa e pelo Mediterrâneo, tal fator alterava decisivamente a correlação de forças a favor dos fascistas.
A política de Stalin e a derrota da República
Para os anarquistas e outros críticos de Extrema Esquerda, boa parte da culpa da derrota do campo republicano espanhol pode ser creditada à política de Josef Stalin, que, desejoso da vitória da República, mas temendo que esta vitória levasse a uma revolução socialista na Espanha que criasse complicações diplomáticas à União Soviética -pois um “Outubro Espanhol” criaria uma divisão ideológica na Europa Ocidental que atuaria contra a política de uma Frente Popular antifascista que era o grande objetivo de Stalin à época – foi capaz apenas de realizar uma ajuda militar tímida, pelo envio de alguns militares, aviões e armas (por estas exportações de armas, Stálin fêz-se pagar com a reserva de ouro do Banco Central Espanhol). Segundo este ponto de vista, instalou na Espanha uma série de agentes da sua polícia secreta, o GPU, que desencadeou uma política de repressões indiscriminadas contra militantes de Extrema Esquerda, anarquistas e trotskistas, visando conter a Guerra Civil dentro de um marco democrático-liberal. O ponto alto destas repressões foi a prisão e morte sob tortura de Andreu Nin, dirigente catalão do semi-trotskista POUM – Partido Operário de Unificação Marxista. Para cúmulo, Stálin ainda encarcerou e matou como traidores os executantes desta política (tais como o velho bolchevique Antonov-Ovssenko, que havia comandado em 1917 a tomada do Palácio de Inverno do tsar em São Petersburgo) quando do seu retorno à URSS, de modo a impedir o questionamento de sua política espanhola.E Isaac Deutscher sumariza: ao tentar preservar a respeitabilidade burguesa da Espanha republicana, sem querer antagonizar as democracias liberais européias, Stalin não preservou nada e antagonizou a todos: a causa da revolução socialista foi perdida, sem que a Direita européia, por um momento sequer, deixasse de ver em Stalin o agitador revolucionário.
Teve fim a guerra com a consequência da morte de mais de 400 mil espanhóis e uma queda enorme na economia, como a morte de mais da metade do gado,a queima de vários campos e milhões de moradias destruídas. Um abalo financeiro e queda do PIB que demorou quase 30 anos para se normalizar. Outras fontes ressaltam a dificuldade em quantificar o número de mortos por causa da guerra originada pelo chamado “Movimiento Nacional”, mas colocam o dado para todo o período do franquismo de mais de 2 milhões de pessoas mortas sob o regime fascista.
A Revolução Social
Revolução Espanhola
Nas áreas controladas pelos anarquistas, Aragão e Catalunha, somando-se às suas vitórias militares temporárias, existiu uma grande mudança social na qual os trabalhadores e camponeses se apoderaram da terra e da indústria, estabeleceram conselhos operários paralelos ao governo, que estava paralisado, e autogestionaram a economia. Esta revolução ocorreu à revelia dos republicanos e comunistas apoiados pela União Soviética. A coletivização agrária obteve um êxito considerável, apesar da carência de recursos, já que as terras com melhores condições para o cultivo estavam em poder dos “Nacionais”. Esse êxito sobreviveu na mente dos revolucionários libertários como uma prova de que uma sociedade anarquista pode florescer sob certas condições como as que haviam durante a Guerra Civil Espanhola.
Mais tarde durante o conflito, o governo e os comunistas receberam armas soviéticas, com as quais restauraram o controle do governo e se esforçaram por ganhar a guerra através da diplomacia e do poder bélico. Os anarquistas e os membros do POUM foram integrados ao exército regular, ainda que a contragosto, e o POUM foi declarado ilegal, após ser falsamente denunciado como instrumento dos fascistas. Num dos episódios mais dramáticos da Guerra, centenas de milhares de soldados comunistas e militantes anarquistas, ambos antifascistas, enfrentaram-se uns aos outros pelo controle dos pontos estratégicos de Barcelona, nas chamadas “Jornadas de Maio de 1937”. Por trás desse conflito estava a divergência básica entre PCE de um lado e POUM e CNT de outro: estes acreditavam que a guerra devia servir para conduzir à vitória na revolução que tinham iniciado; já o PCE acreditava que a revolução lhes minava os esforços diplomáticos para ganhar o apoio das potências ocidentais contra o fascismo, assim como seu esforço de controle sobre a economia e a sociedade de maneira geral.
A guerra civil na Galiza
Na Galiza, zona que ficara na “retaguarda fascista” (militarmente ocupadas logo no início), a luta republicana encontrou a forma de guerrilhas organizadas que levaram a luta até depois de 1940.
A resposta através do método das guerrilhas manteve-se na Galiza até 1956, iniciando-se um período de decadência a partir desta data, devida em parte ao abandono dessa estratégia por parte do PCE, até ocorrerem os últimos assaltos e combates em 1967, com a morte do último guerrilheiro e o exílio doutros.
Segundo dados fornecidos por diferentes historiadores, foram presas ou mortas cerca de 10 000 pessoas relacionadas com a guerrilha galega durante esses anos.
O Franquismo instaurou na Galiza o método dos “passeios” (ir procurar pessoas a sua casa para “passeá-los”, ou seja, fuzilá-los à noite e deixá-los nas valetas). Através deste método do “passeio”, dos conselhos de guerra realizados contra civis, dos fuzilamentos maciços dos prisioneiros e dos confrontos armados com a guerrilha morreram 197 000 pessoas galegas (fonte “La Guerra Civil en Galicia” edic. La Voz) durante o regime franquista, das quais a grande maioria continua em valas comuns. Quanto ao exílio, cerca de 200 mil galegos fugiram exilados para outros países nesse período.
Por outro lado, os campos de concentração mais conhecidos na Galiza são os de Lubián, Lavacolla (Santiago de Compostela) e o cárcere de extermínio da Ilha de São Simão (comarca de Vigo), assim como os respectivos cárceres de cada cidade. Existem ainda em cada cidade ou vila lugares ainda não reconhecidos de fuzilamento maciço e continuado de pessoas que foram consideradas “perigosas” para o regime fascista.
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